Elementos de psicoterapia psicanalógica

A psicoterapia psicanalógica usa estruturas de metodologias como a comparação, a metáfora ou, num âmbito extremamente alargado, qualquer outro tipo analogias constituintes da psicanalogia como método de estudo e compreensão do ser humano, tendo o objectivo fundamental de aliviar o seu sofrimento mental.
Há analogia em tudo, todas as situações, das quais resulta alguma forma de movimentação, alguma forma de alteração, alguma forma de escolha; portanto, há analogia em todas as situações vivenciais onde se manifesta variabilidade existencial com a possibilidade de identificação da diferença e escolha de uma das alternativas; há analogia decisional no momento em que a escolha se realiza, se concretiza; é na analogia decisional, conscientemente volitiva, ou não, que se encontram os fundamentos do ser humano.
Efectivamente, a analogia decisional preconiza a existência de uma ordem interior e um caos exterior, de um meio externo como fonte de variabilidade caótica e um meio interno ordenado, eventualmente pela necessidade, ou carência; um meio interno não apenas capaz de identificar a variabilidade caótica do meio externo mas também capaz tomar decisões, capaz de escolher; capaz de escolher, sempre em obediência a uma ordem interna predeterminada, aquele objecto do meio externo caótico, que melhor consegue satisfazer, ou eliminar, a carência do meio interno.
Os fundamentos teóricos da psicanalogia pressupõem o determinismo de uma ordem existencial primária e presente em toda a existência, em toda a vida, em toda a evolução filogenética, desde os seres vivos mais primitivos até aos mais evoluídos; sempre que existe um movimento, uma alteração, pois, assume-se uma orientação ordenada, determinada pela ordem da psicanalogia comparativa. Qualquer psicanalogia é, fundamentalmente, comparativa; efectivamente procurar aspectos comuns, ou analogicamente semelhantes, ou desiguais é, pois, sempre, uma forma de comparação. A psicanalogia assume várias formas e aspectos do seu desempenho como, por exemplo a psicanalogia competitiva ou a psicanalogia metafórica; efectivamente, a metáfora é uma forma particular de analogia; de facto, é possível efectuar comunicações expressivas e indirectas apenas com linguagem metafórica mas também, frequentemente, a linguagem apresentada pelas pessoas, normais ou patológicas, reveste uma comparação metafórica tanto ao nível verbal como não-verbal. Ainda que comparando os comportamentos, gestos, posturas, modo de vestir, de andar, de sentar, e todos os elementos da linguagem corporal, pois, a metáfora assume uma preponderância fundamental na compreensão das emoções, sentimentos e atitudes mais elementares dos seres humanos.
O dualismo reducionista, como fundamento diferencial da ordem e das suas relações binárias; estabelece, in extremis, a dualidade como fundamento de toda a existência; por conseguinte, nos extremos reducionistas, será forçoso encontrar a dualidade existencial; não a unicidade, não a pluralidade, mas sim a dualidade de algo que observa e algo que é observado, de um interior e de um exterior, de um pensante e um pensado, enfim, de um sujeito e de um objecto; porém, o dualismo reducionista não é necessariamente dicotómico, por conseguinte, a partir de uma dualidade expressa num determinado nível de observação racional e cognitiva pode-se passar imediatamente para um unicismo ou, por oposição, um pluralismo existencial; este tipo de abordagem não contraria o dualismo já que este é apenas um dualismo fundamentalmente reducionista. Em psicoterapia psicanalógica, por semelhança analógica com outras terapias, torna-se, frequentemente, necessário introduzir outros elementos e outras variáveis comparativas e metafóricas, surge a triangularidade estruturalmente fundamental formada pelo terapeuta, pelo doente, que se deve aliar ao terapeuta, e pela doença que terá de ser combatida; porém, existem sempre muitas outras triangularidades que se definem no decurso da doença e respectivo sofrimento. A triangularidade psicanalógica considera os três sentimentos básicos: alegria, amor e ansiedade, em oposição dualista com os seus opostos: tristeza, ódio e segurança.  
A ordem e a desordem estão sempre presentes no desenvolvimento e avaliação das perturbações mentais. A escolha do método de abordagem psicanalógica depende de cada caso no entanto é sempre necessário considerar o duelo conflitual existencial entre patologia e pessoa; o duelo conflitual é a forma mais básica e elementar das estruturas de combate. Ainda que sejam imensos os competidores ou combatentes, eles estabelecem sempre políticas de aliança terminando por uma estrutura de duelo, uma estrutura básica de combate ou competição. No caso da doença ou sofrimento humano, há um dinamismo próprio de combate, de ataque e defesa; até parece que a doença e sofrimento se tornam, como que, possuidores de personalidade e vontade próprias; surge a aliança terapêutica, por um lado da necessidade de ajuda que a pessoa doente sente, por outro, há também a considerar que essa pessoa, em luta contra a doença, ainda tem uma certa força pessoal, uma força capaz de estabelecer, ainda que rudimentarmente, um plano de luta na esperança de concretizar, de vencer o seu sofrimento pessoal.
Há em toda a doença uma involuntariedade que permite a afirmação categórica da fraqueza humana; a aliança terapêutica surge de um pedido de ajuda; ou seja, o ser humano, doente e sofredor, tenta numa primeira fase erradicar autonomamente o seu sofrimento porém, face à sua incapacidade pessoal de conseguir o bem-estar, a saúde; decide pedir ajuda. O pedido de ajuda constitui, desde logo, a primeira formulação primitiva de uma aliança; A força da aliança terapêutica é variavel com a pessoa e a doença; a aliança terapêutica implica, desde o inicio, um reconhecimento da doença mas também da fraqueza própria do doente em conseguir, por meios exclusivamente pessoais, erradicar e debelar o sofrimento. Os doentes psicóticos têm, frequentemente, pouco insight, ou seja, pouca capacidade em reconhecer a sua patologia, ou a natureza patológica da sua conduta; obviamente, um doente com patologia crónica ou personalidade mórbida, também vê o seu insight diminuído porém, a natureza egodistónica do seu sofrimento e a incapacidade pessoal de o erradicar favorece a adesão à aliança terapêutica desde que esta produza alivio dos sintomas e do sofrimento.
O sofrimento parece, assumir um dinamismo próprio de cada patologia que motiva um duelo entre a pessoa, doente ou sofredora, em aliança com o terapeuta e a patologia. O dinamismo da doença não é estático, não é próprio de cada pessoa, nem sequer de cada patologia; os aspectos desse dinamismo são tão variados e diversificamos que a estratégia de combate ao sofrimento poderá ter de ser alterada a cada momento, mais parece um jogo, uma guerra, um combate contra a doença e o sofrimento, esse jogo gera incerteza e risco, esse risco, essa insegurança no controlo adequado da técnica terapêutica, no sentido de erradicar o sofrimento, geram relações dinâmicas entre uma tríade: a doença, o doente e o terapeuta. Nesta dinâmica a três, por vezes forma-se aliança entre doente e doença, outras vezes entre doente e terapeuta, finalmente, nas situações, de alguma forma, mal conduzidas, a aliança surge entre o terapeuta e a doença com eclosão de iatrogenia sempre nefasta.
Há em todo o ser humano uma tendência à estabilidade, conhecida e reconhecida; mudar o comportamento exige sempre uma atenção acrescida, um gasto de energia psíquica adicional; esse esforço de mudança traduz-se em sofrimento incómodo capaz de, por vezes, desmotivar ou desencorajar a tentativa de mudança.
Os três sentimentos básicos do sofrimento humano: ódio, tristeza e medo ou ansiedade, simples ou conjugados, podem sempre ser eliminados, ou aliviados, através de uma psicoterapia psicanalógica; por exemplo, numa breve análise comparativa do medo constata-se que este surge quando a pessoa sente uma ameaça causada directamente por um objecto, ou realidade, constrangedora e causadora de risco, do mundo externo sobre o mundo interno; diz-se que essa pessoa sente um medo cuja estrutura tem como base uma ameaça real causada pelo mundo externo; pode-se afirmar que categoricamente, não há medo sem ameaça e não há ameaça sem medo, por conseguinte, medo e ameaça são as duas faces da moeda, simplesmente, uma está voltada para a vertente externa e a outra para a vertente interna do organismo. A coragem não elimina o medo mas permite enfrentar e neutralizar a acção paralisante que o medo, habitualmente, produz; medo e ameaça são os dois termos do binómio dualista; sendo certo que o medo resulta, sempre, de uma ameaça sentida, é também evidente que essa ameaça tem de ser credível, tem de existir a possibilidade de ela se realizar, assim, quanto maior for a concretização especifica e detalhada da ameaça maior será o medo produzido; obviamente, desde que o ameaçado sinta que o agressor tem o poder de conseguir concretizar, pois, só assim, será maior o risco sentido. Uma ameaça abstracta apenas traduz um desejo de hostilidade patente, por isso, não causa tanto medo e apreensão. A ameaça tem sempre a sua vocação cognitiva direccionada para o futuro, por isso, causa também ansiedade; a fraqueza física e psíquica sentida pela pessoa ameaçada, agravam a percepção como elemento cognitivo da ameaça amplificando o medo com um dinamismo próprio e pessoal. Analisar e compreender o medo e a ansiedade permitem desenvolver uma psicoterapia psicanalógica comunicacional do medo; em cada caso concreto, quanto maior for a compreensão do medo, pois, maior será a possibilidade de o eliminar. A comunicação psicoterapeutica psicanalógica pode ser activada e aplicada em qualquer tipo de sentimento, comportamento, cognição ou atitude, tanto isolados como em conjunto; a sua aplicação permite melhorar toda a saúde mental.
Doutor Patrício Leite, 13 de Outubro de 2019