Há uma dualidade patente na
ordem jurídica mundial. Por um lado os defensores da globalização económica
liberal expansionista pretendem sobrepor o direito internacional privado na
regulação das relações juridicamente significativas entre empresas globais com
a queda dos estados-nação como capaz de impor uma ordem internacional ao nível
privado. Por outro lado os defensores dos estados-nação com a imposição
soberana do direito internacional público na arena das relações internacionais.
O equilíbrio conflitual entre o liberalismo económico desenfreado, apenas regulamentado
pelas leis da oferta e da procura e do direito internacional privado e, por
oposição, o nacionalismo político que regulamenta as relações entre
estados-nação através do direito internacional público é sempre um equilíbrio
dinâmico capaz de fundamentar o discurso legitimador recorrendo a duas teorias.
A teoria unicista insiste num único estado nação que ao nível mundial detém
tanto poder, tanta capacidade de impor uma violência armada, que se transforma
num estado polícia do mundo capaz de, com autoridade legítima, impor uma ordem jurídica
mundial a regulamentar as relações entre os estados e as nações, era esta a
posição dos Estados Unidos da América. Por outro lado a teoria dualista defende
a legitimidade do equilíbrio de poder, num mundo com muitos países, ou actores
políticos; países estes que através de coligações, deslocam o equilíbrio de
poder alterando assim legitimamente a ordem jurídica mundial em conformidade
com a deslocação do fiel da balança; esta é a posição daqueles que defendem a
globalização num liberalismo mundial que permite a ascensão da China na arena
política internacional.
O instinto gregário, o
desenvolvimento da vida em sociedade e o domínio do homem pelo homem, sempre,
ao longo da evolução histórica, sempre, verificaram ao nível mundial, a
sobreposição de uma destas ordens jurídicas. Também a transição alternada entre
estas ordens jurídicas mundiais fez-se sempre à custa de muitas mortes, guerras
e revoluções sangrentas; foi assim com a queda do Império Romano; será assim
com a queda dos Estados Unidos da América. Na realidade, o Império Romano
funcionou, na história da ordem jurídica mundial, como um estado policial que impunha
ao exterior, ao resto do mundo, o mesmo direito e normas jurídicas que
utilizava no âmbito do seu direito interno; a queda do Império Romano, como
centro do poder mundial, ocorreu ao longo de séculos, com muitas e sangrentas
revoluções e guerras, tendo terminado com um feudalismo geográfico assente na
dualidade de forças e poderes resultantes de coligações entre os senhores
feudais. Actualmente as coisas mudam mais rapidamente; os Estados Unidos da América,
com o seu poderio bélico e económico, funcionam como um estado policial
unicista e capaz de condicionar a ordem jurídica mundial porém, a China, e
aqueles que em nome do liberalismo, a apoiam, funcionam como estados
desafiadores desta ordem mundial e baseiam a sua ideologia num neo-feudalismo
empresarial liberal. A transição será, como sempre ocorreu ao longo da história
da humanidade, repleta de revoluções, guerras, derramamento de sangue e morte.
A imposição de barreiras alfandegárias e direitos aduaneiros e a guerra
comercial que se esta a desenvolver entre os EUA e a China, é apenas uma
manifestação da perda de poder dos EUA na manutenção da ordem jurídica e
hegemonia do mundo; face a este enfraquecimento dos EUA, cumpre aos outros
estados-nação do mundo, saber com quem devem efectuar coligações na nova ordem
jurídica mundial que se aproxima e no estabelecimento de um poder estável e pacífico.
A crise apenas vai começar em 2020, a revolução mundial é a próxima etapa. Estabilidade
ou mudança é a interrogação do mundo.
Doutor Patrício Leite, 9 de Outubro de 2018