Antes do Princípio e depois do Fim

Há quem se interrogue sobre a sua própria origem; a origem de seus pais, da vida, da Terra, do Universo, da existência, do ser-enquanto-ser, de tudo. Há quem aponte para um princípio de tudo. Há quem se interrogue: qual a origem do princípio de tudo? E do principio do princípio? E do princípio, do princípio, do princípio, do princípio, …?
Antes do princípio não havia princípio, simplesmente não havia princípio, e antes de tudo não existia tudo pois, se tudo existisse; então não se estaria antes de tudo.
E depois de tudo? E depois do fim?
Depois de tudo, não existirá o tudo, pois se tudo continuasse a existir, então não seria depois de tudo. Depois do fim, o fim terminou, não haverá mais fim. Se antes de tudo existir, não existia o tudo e depois de tudo também este deixa de existir; então tudo apenas existe no presente. Nada existe antes de tudo, nada existe depois de tudo. Se antes do princípio não havia princípio e depois do fim, já não haverá fim; então tudo existe aqui, no presente.
Tudo existe no aqui e agora; nada existe fora daqui e de agora. É no local do momento presente que a consciência se revela. Nada está aquém da consciência, nada está além da consciência. A realidade existencial é uma realidade da consciência. A tendência cultural e científica do conhecimento humano tem-se inclinado para admitir uma realidade existencial independente da consciência que a apreende; actualmente admite-se até que essa realidade externa mude e a sua mudança seja fenomenologicamente independente da consciência que a observa; nada mais absurdo: a realidade não existe separada da consciência, não tem “vida” própria. Os fenómenos científicos são um produto conjunto da consciência e da realidade. Ao nível individual, a consciência confronta-se com um paradoxo fenomenal entre a aparente continuidade da sua existência e a descontinuidade dos seus pensamentos e dos seus raciocínios. Quando se dorme, pára-se de pensar e de raciocinar; quem dorme pára de pensar em si próprio, deixa de saber que existe; mas ao acordar, encontra a sua própria consciência intacta. A identidade corporal da consciência, do ser-que-sabe-que-é, não é racionalmente capaz de justificar a sua continuidade. No plano individual, a dualidade existencial da confrontação paradoxal da consciência consigo própria, conduz a ataques e defesas permanentes e bem conhecidos. Ao nível da consciência colectiva, também a humanidade cria os próprios fenómenos científicos que depois vai observar, estudar e compreender. No plano colectivo, para a humanidade, a realidade externa não é estática e imutável, a realidade muda e quem opera essa mudança é a própria humanidade. É a humanidade que ao alterar a realidade externa, cria novas leis e novos desenvolvimentos técnico científicos. A realidade, ainda que do ponto de vista científico, é um produto da interacção do homem com a natureza que, por isso, nunca será compreendido na totalidade.
Doutor Patrício Leite, 27 de Outubro de 2015